quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Ser marido, avô e pai, sendo mulher transgênera

Se há uma coisa da qual me orgulho na minha vida é de ter dado conta – e de ainda dar conta – de ser marido da minha esposa, pai dos meus filhos e avô do meus netos, apresentando-me e sendo socialmente reconhecida como mulher.

Em um universo de caixinhas tolas e tolices fornecidas em caixas, é uma vitória pessoal sem tamanho ter vencido essas esdrúxulas normas binárias de gênero, em que, para ser pai, é preciso ser homem. "Conselhos" não faltaram para que eu passasse a ser chamada de marida (cruuuzes!), "pãe" (afff!) ou que eu "recomendasse" aos filhos para que, a partir de então, reconhecessem a existência de duas mães, numa clara usurpação do espaço familiar da minha companheira. O pior é que tais "excrescências" na forma de conselhos existenciais partiam - como ainda partem - de pessoas que se consideram ativistas libertárias e combatentes de primeira linha do binarismo de gênero (salve-se quem puder!).
Mas o meu agradecimento mesmo vai para a minha companheira e para os meus três filhos, que aceitaram e compreenderam a importância dessa luta para tentar mostrar que gênero é muito mais do sexo biológico, indevidamente apropriado pela sociedade para fundamentar as suas idiotices transformadas em normas de conduta.
(Letícia Lanz)