segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Ser ou não ser: eis a questão. Mas que graça tem em ser uma ficção?

Not To Be Or Not To Be? by Shuwit
Ser ou não ser: eis a questão. Não foi apenas Hamlet que teve que se haver com esse dilema: qualquer pessoa vive esse drama durante toda a sua jornada existencial. Ninguém está apto a dizer categoricamente eu sou isso, eu não sou aquilo.

Todo ser é uma forma de negação do não ser. Tudo que a gente é está cheio de resíduos do que a gente não é. Resíduos que, de uma hora para outra, podem ganhar força novamente, encorpar-se, multiplicar-se, até o ponto de dominar a cena, ameaçando o que a gente é. Tudo que a gente é, é apenas uma possibilidade transitória do ser, altamente passageira e mutável, que a gente tenta preservar a todo custo à custa de muita repressão e recalque.

O que a gente não é – e principalmente o que a gente não é e tem medo de ser – está sempre na nossa espreita, aguardando o primeiro desconforto, o primeiro “deslize” com a nossa condição atual, para atacar sem piedade com todo o seu arsenal de dúvidas:
- Será? Mas e se não for?
- Eu não deveria estar pensando nisso.
- Mas eu estou “tão bem” na minha identidade atual”.
- O que é que as pessoas vão dizer?
- O que será da minha reputação? Da minha imagem pública?

Quando bate a dúvida do não-ser, só existem duas alternativas:
1 - você se reprime ainda mais duramente, agrilhoando-se nos porões da ditadura do ser, para ser torturado, de minuto a minuto, num inferno sem fim, ou 2 – você dá uma banana (de preferência uma penca inteira) e cai na real, entra no desbunde, descola o rótulo de besta da própria testa e vai ser feliz do jeito que você está querendo ser agora.

Pouca gente dá conta de dar esse grito de independência em sua vida. A maioria prefere a tortura consciente, as estratégias e barganhas neuróticas para domar a força do desejo e manter-se fiel a coisas como imagem e reputação.

O que se ganha em viver uma vida que não é a da gente? Em ser uma pessoa que há muito tempo a gente não é ou, pior, que nunca foi?

Ser ou não ser: não é simples nem fácil responder essa questão. Mas que graça tem em ser uma ficção? Uma sombra desincorporada de alguém que a gente não se permite ser?

Um comentário:

Roberta CrossDressing disse...

Infelizmente o meu ser não tem coragem e nem forças para enfrentar toda essa sociedade...