Meu cartão do banco itaú venceu, não chegou outro pelo correio, e eu preciso muito dele porque é com ele que todo mês eu recebo meu salário-mínimo de aposentadoria. Daí tive que me deslocar até a agência do banco que o INSS escolheu para mim quando eu comecei a receber o meu pé-na-cova. Pra quem não sabe, é o INSS que escolhe a agência. E a minha fica dois bairros adiante do meu.
Cheguei, coloquei o carro num estacionamento pago e marchei para a agência, debaixo de uma chuva fina. Logo na entrada, o primeiro incidente. Coloquei as chaves e o celular no buraco do guarda mas a porta continuou emperrada. Tirei mais umas coisas da bolsa, mas a porta, nada. Catei mais umas moedas e nem sinal da porta abrir. Daí o cara que estava atrás de mim na fila resolveu dar uma de guarda-auxiliar do banco e começou a me dar instruções:
- Tire o relógio... Tire esse medalhão que é de metal...
Eu virei para trás e disse a ele:
- O senhor quer parar de me dar instruções? Eu ainda não estou senil e essa tarefa é do guarda, não sua!
Como todo idiota faz, o idiota se defendeu da sua própria idiotice:
- Eu só estava querendo ajudar e a senhora é muito mal-educada!
Revidei na hora, na mesma moeda:
- E o senhor é um grande intrometido, entrando em coisa que não é da sua conta.
O bate-boca deve ter acelerado o guardinha do banco e a porta rolou que foi uma beleza.
Aí começou o meu segundo calvário da tarde.
Estava retirando a ficha para atendimento na mesa quando fui interpelada por uma atendente.
- Boa tarde. Posso ajudar a senhora?
- Sim. Eu preciso de um novo cartão do banco pois o meu venceu e eu não recebi outro.
- A senhora pode me mostrar o seu cartão?
- Sim.
Procurei o cartão na carteira e entreguei para a atendente, junto como o meu RG.
- Mas esse cartão aqui é do sr. Geraldo...
- Sim, senhora, Geraldo sou eu mesma.
- Ah, me desculpe, “sr. Geraldo”... A senhora vai ter mesmo que pegar a senha e aguardar para ser atendida na mesa.
Não era exatamente isso que eu estava fazendo antes da bisbilhoteira idiota chegar me oferecendo ajuda?
Pouco depois, apareceu o meu número no painel de atendimento. Mesa 4. Lá fui eu.
- Boa tarde, senhora! Saudou-me efusivamente um gerente nos seus trinta e tantos, com um sorriso "doriana" ensaiado e um aperto de mão de roxear.
- Então? Em que posso ajuda-la?
Recontei a história. Entreguei o cartão vencido e o meu RG e fiquei aguardando pra saber qual seria o trotar da carruagem.
- Mas esse cartão é do sr. Geraldo... E o documento também.
- Sim, sou eu “mesma” o senhor Geraldo.
- Ah, me desculpe, desculpou-se o gerente, sem demonstrar nenhuma vontade real de se desculpar.
- Não desculpo, não, senhor. O senhor não sabe o que é passar o tempo todo nessa lenga-lenga de nome. Ninguém procura saber como é que a gente gostaria de ser tratada...
Nenhum comentário do outro lado. Nenhum gesto de acolhimento. Nenhuma pergunta de como eu gostaria de ser tratada. Um perfeito energúmeno.
- Aqui consta que o cartão foi para o seu endereço, SR. GERALDO. E como o SENHOR não o recebeu vou ter que cancelar por extravio e emitir outro. O SENHOR pode confirmar para mim alguns dados?
Eu disse que sim entre os dentes, quase vociferando de tanta raiva do itaú.
- Nome completo... (o boçal já sabia)
- Endereço... (ele já tinha checado comigo duas vezes)
- Data de nascimento... (estava no RG)
- CPF (também estava no RG)
- Nome do pai (pra que que serve a porra do RG na mão dele, hein?
Depois desse estúpido e desnecessário interrogatório, a conclusão:
- Pronto, SENHOR GERALDO. Agora é só fazer o pedido de um novo cartão.
E fez toda a mesma ladainha de novo! Devia ser para confirmar se eu realmente sabia o meu nome e o meu endereço de cor; se eu não era uma fraude tão completa quanto ele devia estar imaginando...
- Dentro de 15 dias o SENHOR receberá o novo cartão. Mas se quiser um provisório, é só passar no caixa... Por falar nisso, vi aqui na sua conta que o SENHOR ainda não utilizou o empréstimo consignado que tem direito. Vamos fazer um agora?
- Não, obrigada.
- Vamos sim! O SENHOR está perdendo uma ótima taxa de juros, SENHOR GERALDO.
- Não, senhor, eu não quero.
- Então está bem. Posso ajudar o SENHOR em mais alguma coisa? Tive vontade de dizer que sim; que ele fosse ao sanitário mais próximo, enfiasse a cabeça no vaso e desse descarga. Mas me contentei em sai andando, sem dizer nada.
- Então bom fim de semana e que o SENHOR ABENÇOE.
Quando ele disse “que o senhor abençoe”, eu entendi tudo. Que merda de mundo em que o religioso invadiu todos os campos, até mesmo o mais-do-que-leigo campo das finanças. Em breve, Banco Itaú, mais um banco do Senhor.
Fui ao caixa arrumar o tal cartão provisório. Nem preciso dizer que começou tudo de novo. Tudo numa única e simples tarde de sexta-feira, de chuvinha fina. E eu até colocaria a culpa na chuva, se a culpa todo não fosse dessa porcaria de BANCO ITAÚ. É a segunda vez que sou tratada com esse desdém todo por um gerentinho pinico, provando mais uma vez que o banco caga e anda para a população transgênera, deixando de ensinar seus quadros a lidar com transidentidades. E, como vingança, nem tirar a minha fortuna do banco eu posso, pois é onde o INSS deposita meu abono terceira-idade.
Por último, façam-me um favor do tamanho de um elefante: não me falem nem de brincadeira NESSA BOSTA DE NOME SOCIAL!!! Nunca mais!!!
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