Nas sociedades de todas as épocas, em todos os locais do planeta, sempre foi expressiva a prática de travestismo ou crossdressing entre machos biológicos. Os estudos pioneiros do Dr. Harry Benjamin sobre transgeneridade, realizados na década de 1950, não só apontavam a práticas do travestismo como o traço mais evidente e comum entre identidades transgêneras MtF (masculino para feminino) quanto a manifestação mais elementar e persistente da própria transgeneridade.
Fato é que o travestismo (ou crossdressing) não é uma diversão ou passatempo de fim de semana como, infelizmente, divulgam muitos clubes que reúnem os chamados “crossdressers”, mas uma grave manifestação de não-conformidade com as normas de conduta de gênero que, aliás, costumam ser absolutamente duras com qualquer manifestação de travestismo por parte dos homens, punindo-a dura e prontamente.
Isso não acontece no caso das mulheres, cujo código de vestuário, desde meados do século XX, tornou-se altamente flexível, incorporando peças e acessórios até então exclusivos do guarda-roupa masculino.
Ao contrário do guarda-roupa das mulheres, após a “orgia geral de vestuário” da década de 1960, a indumentária masculina tornou-se cada vez mais rígida, séria, monocórdica e fechada. Cada vez mais, o vestuário masculino se estabelece por oposição ao vestuário feminino. De tal forma que, se um tipo qualquer de roupa ou calçado, mesmo os mais tradicionalmente masculinos, passarem a ser usados pelas mulheres, é sumariamente cortado da lista de itens do código de vestuário masculino.
Ao contrário do guarda-roupa das mulheres, após a “orgia geral de vestuário” da década de 1960, a indumentária masculina tornou-se cada vez mais rígida, séria, monocórdica e fechada. Cada vez mais, o vestuário masculino se estabelece por oposição ao vestuário feminino. De tal forma que, se um tipo qualquer de roupa ou calçado, mesmo os mais tradicionalmente masculinos, passarem a ser usados pelas mulheres, é sumariamente cortado da lista de itens do código de vestuário masculino.
Foi o que ocorreu, por exemplo, com as botas de montaria, considerados itens masculinos por excelência e que, de uns tempos para cá, só aparecem nos pés das mulheres... Destino idêntico teve o colete, peça de roupa tipicamente masculina que praticamente desapareceu do guarda roupa masculino depois que passou a ser usado pelas mulheres.
A questão é que, se um homem for pego vestido de mulher, sua reputação de homem vai imediatamente para o lixo, junto com as todas as vantagens, regalias e privilégios socialmente concedidos ao homem cisgênero.
Portanto, a pessoa com forte motivação para se travestir, fica permanentemente diante do terrível dilema de atender a força do seu desejo ou resguardar-se da fúria da sociedade em punir homens que transgridem o código de vestuário masculino.
O resultado desse terrorismo de gênero, é que uma boa parte de travestis e crossdressers tentam fazer e manter suas montagens às escondidas, em total sigilo. Algo, diga-se de passagem, praticamente impossível num universo vigiado por um exército de câmeras, 24h por dia. Em que uma simples e inofensiva foto da pessoa “montada” pode circular livremente nas redes sociais, alcançando instantaneamente todo o planeta, abrindo o baú das punições sociais para quem transgride o dispositivo binário de gênero.
Se estiver empregada, a pessoa corre o risco de perder o emprego. Se tiver um círculo de amigos, e nem precisam ser tão “machistas”, vai virar motivo de gozação e chacota para todos eles, com o fato adicional de ser promovido imediatamente à categoria sexual de viado. Se for um profissional liberal, corre o risco de perder todos os seus clientes. Se for religioso, vai ser excomungado da sua comunidade de culto. E se for casado, na maioria absoluta dos casos, vai conseguir despertar o ódio e o desprezo da esposa, para sempre, que também influenciará, de forma direta, seus filhos (caso tenha), familiares e círculo de amizades.
Não é nem um nem dois casos que eu conheço em que uma inofensiva prática de crossdressing acabou destruindo a vida pessoal e profissional de homens sensíveis, íntegros e trabalhadores. Muitos levam anos para se recuperar do trauma psicológico, moral e financeiro, como muitos jamais conseguem se reerguer plenamente.
Estou voltando a esse tema porque, no fim de semana passado, recebi mais um apelo de alguém que se identifica como crossdresser vivendo momentos de desespero e desalento. A mulher voltou antes e apanhou-o montada e produzida. Enlouquecida com o que viu “do seu homem”, expulsou-o de casa, sem direito a nada, ameaçando-o de divulgar na internet as fotos que tirou dela montada.
Não vale a pena fazer as coisas escondido, pelo menos das pessoas que vivem mais próximas de nós. Nunca valeu, mas, no mundo de hoje, é uma espécie de suicídio moral premeditado. Pode não acontecer nada, mas pode dar bosta, como deu em dezenas e dezenas de casos que eu conheço.
O melhor é chamar as pessoas próximas, e confessar-lhes a prática do travestismo e a sua impossibilidade pessoal de eliminar isso da sua vida. Chame também os amigos e colegas mais próximos e diga-lhes a mesma coisa. Alguns vão compreender e até aceitar. Outros, vão achar ridículo, imoral e outras merdas do tipo. Mas é melhor enfrentar logo o monstro, de cara lavada e de frente, do que viver permanentemente na eminência de ser devorado por ele.
Fica aqui a minha dica: não confesse, de cara, que você é travesti, crossdresser, transexual ou o que o valha. Diga que você gosta de fazer montagem de dragqueen. Para a sociedade, essa não é apenas a forma mais aceitável de transidentidade nesse momento, gozando de modo geral da simpatia de (quase) todas as pessoas. É também facílima de explicar e de justificar, ao contrário de outras transidentidades, muito mais difíceis de ser explicadas e aceitas (engolidas).
Por outro lado, é preciso denunciar veementemente o machismo de certas mulheres, determinadas a acabar com a reputação de maridos, noivos, namorados e até amigos que se travestem. É plenamente legítimo e aceitável que elas não queiram conviver com companheiros que praticam travestismo. Mas isso não lhes dá o direito de acabar com a vida deles e muito menos de ameaçá-los com chantagens e retaliações.
Por outro lado, é preciso denunciar veementemente o machismo de certas mulheres, determinadas a acabar com a reputação de maridos, noivos, namorados e até amigos que se travestem. É plenamente legítimo e aceitável que elas não queiram conviver com companheiros que praticam travestismo. Mas isso não lhes dá o direito de acabar com a vida deles e muito menos de ameaçá-los com chantagens e retaliações.
O melhor mesmo é falar a verdade e dar tempo ao tempo para ver o que acontece. É menos perigoso e ameaçador fazer isso do que ficar exposto às ameaças de pessoas transfóbicas e inescrupulosas.
Um comentário:
TExto muito interessante Leticia, tenho acompanhado seu trabalho e gostaria de ter um encontro ou contato com voce pois tenho pretensão em desenvolver um pré projeto para o Curso de mestrado em design da UFPR. agradeceria o contato meu face segue e meu e-mail é cassio.villa@hotmail.com
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