quarta-feira, 13 de abril de 2022

A função de uma intelectual

A função de uma intelectual é produzir e estimular reflexão e debate sobre a realidade sociopolítico-cultural do mundo em que vivemos. É uma atividade clínica e cirúrgica, cuja ferramenta principal é o pensamento crítico, empregado na identificação, descrição e crítica sistemática do fenômeno social nas suas múltiplas facetas e ramificações. Nesse território, não deve haver espaço para versões romanceadas, caricaturadas ou “fakeadas” da realidade: as hipóteses, análises e conclusões precisam expressar, com o máximo de verdade e rigor, a realidade dos fatos, das ideias e das pessoas. 

Ainda que submetida à minha própria limitação humana, que envolve coisas como dúvida e erro, indesejáveis para uma análise precisa e isenta das coisas, tenho buscado descrever a realidade com o máximo de realismo e honestidade que a minha mente e os meus sentimentos conseguirem alcançar. Não fui eu que inventei a dureza das afirmações que faço, amparada por minhas observações atentas e análises minuciosas da realidade. São os fatos que aí estão que dizem, por si mesmos, a merda que esse mundo está. Não é possível fazer retoques ou dourar a pílula sem transformar a realidade numa pobre e grotesca caricatura de si mesma. 

Mas, por favor, não confundam denunciar o estado das coisas com estar se sentindo deprimida e depauperada com o estado das coisas. Agradeço a consideração de todas as pessoas que acham que eu estou “sofrendo” ao descrever e criticar a dureza dos fatos à minha volta, mas eu não estou. Sofrimento não tá com nada, como escrevi recentemente em uma das minhas postagens, despertando, inclusive, a revolta de muitas pessoas adotaram o sofrimento como estilo de vida: não é o meu. Eu não sofro ao fazer a minha função de intelectual de denunciar as mazelas do meu tempo. 

Eu apenas cumpro a função que escolhi, por livre e espontânea vontade, e pela qual não sou nem remunerada. Meu convite é para quem eventualmente me leia não entre nessa neura indesejável de “sofrer por sofrer”. O que eu faço não é manifestar o meu próprio sofrimento e muito menos emular o sofrimento de outros, com o peso das minhas palavras, mas produzir conscientização, indignação e ação, individual e coletiva, sem o que nada muda.

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