quinta-feira, 31 de agosto de 2023

A Sociedade de "Bonsais"...

Bonsai é uma arte tradicional japonesa cujo propósito é criar exemplares em dimensões reduzidas de grandes árvores e arbustos. Através do Bonsai, plantas cuja natureza é ser grande são transformadas em miniaturas de si próprias, em um tamanho muitíssimo menor do que a planta original poderia ser. 

A arte de produzir bonsais consiste essencialmente em restringir ao máximo o que seria o crescimento normal da planta, através de podas constantes e o emprego sistemático de arames para modelagem forçada. A poda é vital no bonsai, pois controla e retarda o crescimento da planta, assegurando a longo prazo a manutenção do tamanho diminuto da árvore. 

Eu vejo a sociedade como uma habilidosa e competentíssima produtora de bonsais, exemplares de pessoas que seriam naturalmente grandes se deixadas a si mesmas mas que são forçadas a se transformarem em miniaturas através da ação opressiva e castradora da sociedade em que vivem. Com a imposição de normas de conduta e regramentos morais que restringem radicalmente a ação de cada indivíduo, qualquer sociedade, de qualquer época e lugar interdita, limita e impede radicalmente o livre crescimento pessoal e profissional de seus membros. 

Devemos reconhecer que, sem esse aparelho normativo-repressivo, as pessoas seriam deixadas a si mesmas, livres para fazerem o que bem quisessem, sem nenhuma restrição normativa, o que levaria a sociedade à total desordem, à insegurança e ao caos. Por isso mesmo, o propósito principal do surgimento de sociedades, conforme nos mostrou Freud, é a garantia da ordem e da segurança de todos, mediante restrição à livre manifestação dos impulsos primários de cada pessoa. 

Mas se essa regulamentação da conduta dos indivíduos é necessária para o bem estar de todos, ela é também uma barreira ao livre crescimento pessoal e profissional dos seus membros. As normas de conduta regulam e reforçam o que a sociedade considera ser o comportamento aceitável (e desejável) de cada indivíduo, criando um sistema de controle que suprime a criatividade, a iniciativa e o pensamento inovador, elementos críticos para o desenvolvimento pessoal e profissional de cada pessoa e da sociedade como um todo. Tal como um “bonsaista” faz com uma muda de árvore, as normas de conduta impostas pela sociedade impactam profundamente o crescimento possível de cada indivíduo, sufocando o seu verdadeiro potencial, podendo limitar para sempre a sua trajetória existencial. 

Se, de por um lado, a conformidade às estruturas impostas pela sociedade garantem a estabilidade do sistema como um todo, por outro limitam e castram de maneira radical as perspectivas de crítica, inovação e pensamento independente de cada um dos seus membros. Ou seja, o livre-pensar, a criatividade e a inovação são exaustivamente desencorajados em prol da adesão de todos às regras de conduta estabelecidas pelo status-quo. 

Tal como a poda e a amarração dos galhos garante, no bonsai, a restrição do crescimento da planta, as normas de conduta impostas pela sociedade podam e amarram radicalmente o âmbito de ação de cada pessoa, dificultando e até mesmo impedindo a sua capacidade de explorar e de criar além dos inúmeros regramentos morais existentes. São esses regramentos morais que ditam o estilo de vida que a sociedade permite a cada indivíduo, interferindo inexoravelmente nas suas escolhas pessoais e profissionais. Assim é criado o mesmo ambiente de controle e estagnação que leva ao surgimento do bonsai, inibindo os membros de crescerem e se desenvolverem para atingir todo o seu potencial, tornando-os ao mesmo tempo acomodados e indolentes, incapazes de romper a inércia existencial e sair da “pseudo zona de conforto” em que a sociedade os coloca. 

Libertar-se da opressão das “podas” e “arames” sociais é uma perspectiva assustadora para a maioria das pessoas. De tanto ser bonsai, a maioria já se esqueceu ou nunca pensou que o seu destino vai muito além da perspectiva de serem miniaturas de si mesmas. 

Crescimento pessoal e profissional depende de cada uma ir além, muito além, desses limites sociais, o que só é possível dentro de um ambiente que promova a diversidade, a criatividade e o pensamento crítico. Ou seja, exatamente o oposto do tipo de sociedade em que vivemos, cujo propósito principal tem sido restringir e combater a diversidade, a originalidade e o senso crítico, em nome de garantir a ordem e o bem estar de todos. 

Paradoxalmente, a única forma da própria sociedade libertar-se da escravidão auto-imposta é a promoção de ambientes que permitam e estimulem as pessoas a explorar e expressar as suas perspectivas existenciais únicas, abrindo os horizontes individuais e grupais para maiores oportunidades de crescimento pessoal e profissional para cada um e para todos. 

Em resumo, as normas da sociedade limitam, restringem e impedem, sem dúvida, as possibilidades de crescimento pessoal e profissional. No entanto, reconhecer estas limitações e lutar pela mudança pode realmente abrir o potencial de crescimento e desenvolvimento a nível individual e social. 

O papel da sociedade na restrição do crescimento individual é amplo e profundo, onde ela age como uma verdadeira “produtora de bonsais”. No entanto, é igualmente necessário compreender o papel que cada indivíduo desempenha na subversão das normas de controle, ousando ir muito além das podas e amarras de bonsai impostas pela sociedade a cada um e a todos os seus membros, de modo a alcançar o verdadeiro potencial de crescimento humano, individual e coletivo.

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